Quando se considera maneiras de modular positivamente a própria saúde, deve-se começar com a alimentação e o estilo de vida que também influenciarão a composição microbiana residente no ambiente intestinal. Descobertas acerca da microbiota intestinal e seu co-metabolismo sugerem que se pode explorar novas abordagens de tratamento para modular a saúde mental. Para simplificar a compreensão, há uma derivação entre o intestino e cérebro, onde microrganismos comensais através do eixo microbiota-cérebro (MGB) afetam órgãos e sistemas.
A microbiota intestinal co-evoluiu de maneira benéfica com seus hospedeiros. A relação simbiótica promove produção de vitaminas, nutrientes vitais e energia de diversas fontes dietéticas para seus hospedeiros e para si. Sabe-se que a microbiota está envolvida no desenvolvimento inicial da barreira hematoencefálica e a homeostase e o estabelecimento do sistema circulatório e do sistema imunológico são influenciados pela microbiota e seus metabólitos. Além disso, os estressores oxidativos e inflamatórios são os principais propagadores da patogênese de doenças mentais. Os transtornos psiquiátricos e neurocognitivos de saúde mental contribuem para o aumento da taxa de morbidade por todas as causas.
As doenças mentais podem variar de condições psicóticas, como esquizofrenia e transtorno bipolar, a transtornos de humor, abrangendo depressão e ansiedade. Na população em geral, a esquizofrenia afeta 20 milhões de pessoas em todo o mundo, com uma prevalência de 0,3–0,7%, enquanto o transtorno bipolar tem uma prevalência de 1,8%, afetando até 45 milhões de pessoas.
O eixo microbiota-intestino-cérebro denomina uma importante interação entre a microbiota intestinal e o hospedeiro por meio de diferentes mecanismos internos. Este eixo é capaz de influenciar o cérebro e tem um impacto profundo no humor e comportamento. Enquanto os mecanismos estão evoluindo, este eixo consiste em uma comunicação bidirecional entre o cérebro e a microbiota utilizando vias imunológicas e inflamatórias, neurotransmissores, subprodutos microbianos e sinalização neuroendócrina e enteroendócrina, em resposta ao estresse, e o nervo vago.
Sob condições fisiológicas normais e homeostáticas, há um estado inflamatório de repouso considerado saudável, onde a microbiota estimula a liberação de citocinas e quimiocinas que permitem a regulação da população bacteriana no ambiente intestinal. Em especial, a camada epitelial do intestino secreta uma camada de muco, e a maioria das interações entre microbiota e hospedeiros ocorrem nessa camada mucosa. Essa interação pode ser efetiva ou não, e depende da resposta imune inata. Enterócitos dentro do intestino têm receptores imunes inatos e liberam quimiocinas e citocinas e podem influenciar o sistema imunológico local.
Todavia, em situações de inflamação aumentada e disbiose intestinal, há o enfraquecimento da barreira intestinal que leva à infiltração bacteriana e aumento de lipopolissacarídeos plasmáticos (LPS). As bactérias intestinais, neste caso, podem causar uma resposta neuroinflamatória e influenciar o eixo Hipotálamo-Pituitária-Adrenal (HPA) através do aumento da produção de citocinas e quimiocinas, que podem chegar ao cérebro através do sangue, sistema linfático e nervo vago, causando inflamação neuronal e possível surgimento de doenças mentais e cognitivas.
A microbiota abriga diferentes cepas de bactérias que têm demonstrado produzir diferentes neurotransmissores, como o ácido gama-aminobutírico (GABA). Em particular, Lactobacillus e Bifidobacterium produzem norepinefrina e acetilcolina, bem como Escherichia, Bacillus e Saccharomyces spp. Os Bacillus produzem dopamina, e a serotonina, considerada o “hormônio da felicidade”, é produzida por Escherichia, Enterococcus, Candida, e Streptococcus. Outras várias bactérias intestinais, como Clostridium e Pseudomonas, estão envolvidas no metabolismo do triptofano, o precursor da serotonina. Todas essas substâncias têm grande relevância na saúde mental, pois podem desempenhar papel neurológico, e a disbiose, com aumento de inflamação e diminuição de cepas produtoras de neurotransmissores e hormônios, tem impacto negativo na saúde mental, com surgimento de transtornos psiquiátricos como ansiedade, depressão, e Doença de Alzheimer.
Referências
GENEROSO, Jaqueline S.; GIRIDHARAN, Vijayasree V.; LEE, Juneyoung; et al. The role of the microbiota-gut-brain axis in neuropsychiatric disorders. Brazilian Journal of Psychiatry, v. 43, n. 3, p. 293–305, 2021. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbp/a/vcVptJTbDB4M4CdscTTLGFj/>.
HALVERSON, Tyler; ALAGIAKRISHNAN, Kannayiram. Gut microbes in neurocognitive and mental health disorders. Annals of Medicine, v. 52, n. 8, p. 423–443, 2020. Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7877977/>.
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